QUAL A COR DO LÁPIS COR DE PELE? Para responder essa pergunta proponho a discussão de um tema muito presente em nossa sociedade nos dias de hoje – a diversidade
Para começar esta conversa, quero contar a história da menina Coraline, do livro A cor de Coraline (Editora Rocco), escrito e ilustrado pelo paulistano Alexandre Rampazzo.
Certa manhã Coraline estava na sala de aula, quando um coleguinha se aproximou e disse: Coraline, você me empresta o lápis cor de pele? Essa pergunta deixou a menina intrigada. Ela olhou para sua caixa de lápis de cor e pensou: Cor de qual pele?
QUAL A COR DO LÁPIS COR DE PELE? De que pele estamos falando?
Essa história traz o tema da diversidade de maneira lúdica para as crianças, e instiga importantes questionamentos, tais como: identidade, representatividade e empatia.
Assim como na natureza, onde a variação entre semelhantes é imensa, entre nós seres humanos também encontramos as mais variadas constituições e características físicas – em relação a peso, altura, formato de rosto, tipo e cor de cabelo, de olho e ainda de pele. Todas essas variações fazem com que ninguém seja igual a ninguém. Somos semelhantes, porém diferentes uns dos outros.
O Brasil é um país composto por diferentes etnias, o que resulta numa grande variedade de tons de pele entre nós. Essa variedade foi retratada no trabalho da artista plástica carioca Adriana Varejão. Em sua obra intitulada Polvo, Adriana traz a beleza da miscigenação brasileira.
A série Polvo foi inspirada no censo do IBGE de 1976, que nesse ano, fez pela primeira vez uma pergunta aberta aos brasileiros: “Qual a sua cor de pele?”. Foram 136 respostas que apresentaram nomes como sapecada, encerado, branquinha, morena-bem-chegada, morena-jambo, queimada de praia, cor-de-ouro, puxa-para-branco. A artista selecionou 33 nomes e criou 33 bisnagas de tons diferentes para sua obra.
Como fica então a tal “cor de pele” identificada por aquele rosadinho que não representa a cor de quase ninguém? Usar o bege ou o rosa como cor de pele não mostra a riqueza da diversidade humana. Trata-se de uma convenção que carrega em si fissuras sociais e culturais que precisam ser discutidas para que preconceitos e discriminações não se perpetuem em nossa sociedade.
O projeto Humanae criado pela fotógrafa e artista brasileira Angélica Dass, é uma tentativa de cutucar tais fissuras mostrando e ampliando a paleta de cores de pele da espécie humana. Esse trabalho teve início em 2012 na Espanha, onde mora a artista, e já retratou mais de 3.000 voluntários em 15 países. Angélica diz que o Brasil é a nação mais colorida, ao mesmo tempo que é o país onde o preconceito encontra-se institucionalizado e velado.
Para estimular essa reflexão desde cedo, histórias como A Cor de Coraline são importantes e obras artísticas como as de Adriana e Angélica podem inspirar excelentes trabalhos com as crianças.
Outras iniciativas reforçam também o trabalho de conscientização que precisamos fazer, como a da empresa brasileira de produtos de arte – a Koralle, que acaba de lançar o kit de lápis com 24 tonalidades de pele. Em parceria com professores de um curso da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que promove a igualdade racial nas escolas, a empresa atualizou seu kit de 12 cores criado em 2016. Assim todas as crianças terão a chance de ter sua cor representada ao colorir um desenho.
A diversidade é o que torna a vida surpreendente e revela a beleza existente em cada ser humano. Ser diferente é absolutamente natural. Reconhecer e valorizar as diferenças nos enriquece enquanto sociedade. Estar na roda da diversidade, lado à lado com as diferenças, é viver de maneira ética, e ser ético é nosso dever enquanto seres humanos.
Acabo de concluir um curso de pós-graduação em Deficiência Intelectual, e o que ficou muito marcante para mim é que somos parte de uma sociedade discriminatória e excludente. Dessa forma, temos que ser vigilantes de nós mesmos para combater a naturalização de comportamentos e posturas preconceituosas. A família e a escola tem papel preponderante para a construção de uma sociedade pluralista.
Voltando ao começo da nossa conversa, Coraline imaginou inúmeras possibilidades para atender o pedido do amiguinho e nos surpreende com a cor do lápis cor de pele que entregou à ele. Vale a pena ler a história completa.
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Fica aqui a dica de outra publicação que aborda o mesmo tema de maneira bem distinta. Trata-se de um livro-imagem – uma narrativa sem palavras, de autoria do ilustrador Maurício Negro, intitulado Gente de Cor, Cor de Gente (FTD). Livros só com imagens estimulam narrativas próprias e propiciam ricas discussões entre as crianças, experimente.
Abraços multicoloridos
Ana Lúcia Machado