SÍNDROME DE DOWN – O QUE MUDOU NAS ÚLTIMAS DÉCADAS

"Trate o homem como ele é, e ele permanecerá como é. Trate o homem como ele pode e deve ser, e ele se tornará o que pode e deve ser." - Goethe

Dia 21 de março, comemorou-se o Dia Internacional da síndrome de Down.  Esta data serve também para se refletir  sobre o que mudou nas últimas décadas. Como se sabe, esta síndrome é caracterizada pela quantidade maior de material  cromossômico –  três cromossomos 21, 21/3, daí a razão da data escolhida.

As datas comemorativas são importantes para a conscientização coletiva e contribuem gradualmente para avanços significativos em defesa da  causa das minorias. Uma quantidade enorme de informações e notícias circularam pelas redes sociais, tele jornais e mídia em geral neste dia.

Lembrei que em 2007 li de Cristóvão Tezza, escritor catarinense, seu romance O Filho Eterno, uma obra autobiográfica que relata as vicissitudes  enfrentadas  pelo escritor  desde que recebeu a notícia que seu filho recém nascido tinha síndrome de Down, no início dos anos 80.

O ano passado  a obra  de Cristóvão Tezza estreou na telona, sob direção de Paulo Machline. Esta história nos faz refletir sobre o quanto mudou nos últimos 35 anos a compreensão sobre a síndrome de Down, e a qualidade de vida dessas pessoas.

Síndrome de Down

 

Hoje a síndrome de Down não é mais vista como uma questão de saúde, mais sim como uma condição da existência, assim como um indivíduo tem olhos castanhos, é loiro, etc.

Uma rápida retrospectiva  constatará a evolução até mesmo na nomenclatura adotada internacionalmente que aboliu o termo mongolismo em 1961, substituindo -o por Trissomia do cromossomo 21 e síndrome de Down. Nomenclaturas são importantes, pois muitas carregam em si preconceitos e vão levantando muros só de serem pronunciadas, ao passo que o contrário também é verdadeiro. Daí o cuidado com a escolha, visando contribuir para derrubar preconceitos.

Pais de crianças com dificuldades em geral, não sentem mais constrangimentos em exibir seus filhos, tampouco essas crianças são enclausuradas em  casa. Hoje as vemos  crescer, estudar, namorar, cursar universidades, trabalhar  e casar. Elas aprendem a enfrentar as dificuldades da vida, como a vida é.

Equipes multiprofissionais  de estimulação precoce trabalham essas crianças  desde o nascimento. As famílias por sua vez estão atentas na construção da  autoconfiança e estímulo da socialização de seus filhos. Há um trabalho intenso visando a autonomia e independência desse indivíduo em cada etapa do seu desenvolvimento.

Apesar dos avanços, das conquistas sociais, temos uma longa caminhada. O sistema  educacional ainda é nosso grande desafio. Na hora em que as famílias saem a procura de uma escola para seus filhos, dá-se início a uma exaustiva maratona.  Nas visitas às escolas e entrevistas, tudo parece correr bem até que se diga que a criança tem síndrome de Down, como conta a publicitária Ana Castelo Branco, na edição deste mês da revista Pais e Filhos:

“Em três escolas a história foi exatamente a mesma. Eu ia conhecer o lugar, conversava, tirava dúvidas e perguntava sobre as vagas. Tem? Não tem? Sempre tinha. Tinha. Até eu fazer a revelação: meu filho tem síndrome de down. A partir daí, o roteiro se repetia. Começava com um ‘Veja bem’ e terminava mais tarde com uma ligação dizendo que havia acontecido um engano e que não havia mais vagas para o Mateus.”

Crianças com síndrome de Down tem capacidade de estudar em escolas regulares e mais tarde também são capazes de trabalhar. Fala-se em educação inclusiva há 20 anos , tanto para escolas públicas como privadas. Entretanto o que se vê é ainda muito despreparo das instituições e seus profissionais. Vemos uma dificuldade no reconhecimento e acolhimento da singularidade da criança. Temos que buscar amadurecimento em relação à convivência com as diferenças  e  a valorização do aprendizado por meio da diversidade.

Atualmente encontramos grandes histórias de superação e vitórias que nos servem de exemplo,  como a do ator espanhol Pablo Pineda, do vídeo acima, primeiro europeu com síndrome de Down a se formar em uma universidade e da Isabella Springmühl, uma designer de moda de sucesso da Guatemala.

O ano passado minha família foi presenteada com a chegada de mais um membro, o Gabriel, com síndrome de Down.  Desde então nos sentimos mais unidos e mais fortes. Sabemos que o pequeno Gabriel proporcionará crescimento e aprendizado para todos nós. Com isto, já me pus a caminho na busca de novos conhecimentos com o objetivo de atuar e lutar em prol da educação inclusiva, pensando não apenas em beneficiar meu querido sobrinho, mas todas as crianças. Iniciei este mês um curso de Pós Graduação na APAE de São Paulo.

Síndrome de Down

 

Precisamos  ser facilitadores na superação das dificuldades dessas crianças, e estimuladores das suas potencialidades.  Não devemos aceitar rótulos que coloquem o ser humano em caixinhas, e diagnósticos que abafem o potencial humano. Devemos acreditar que cada ser é único e que pode ser capaz de desenvolver seus talentos. Para mudar paradigmas é preciso alterar a consciência, e para isso a reflexão é essencial.

 

Há uma citação de Goethe que sustenta minha fé e prática:

 “Trate o homem como ele é, e ele permanecerá como é. Trate o homem como ele pode e deve ser, e ele se tornará o que pode e deve ser.” 

 

Que a força dessa verdade sustente e inspire pais e educadores.Que possamos refletir sobre isso, ganhar consciência e nos mobilizarmos para as mudanças necessárias.

Participe, colabore para o despertar dessa consciência compartilhando essas ideias. Deixe seu comentário e observações para enriquecermos este debate.

Abraço carinhoso

Ana Lúcia Machado

10 Comments

  1. Responder

    Fernanda

    28 de março de 2017

    Olá Ana Lúcia!
    Fico muito lisonjeada que minha aula pode servir a você de inspiração.
    Ótimo texto, contempla aspectos importantes sobre a inclusão, além de uma grande sensibilidade.

    Há um um livro extraordinário, que chama-se MUDE SEU FALAR QUE EU MUDO MEU OUVIR, da instituição Carpe Diem. Ele retrata a verdadeira realidade vivenciada por 6 jovens com Deficiência Intelectual. Sabe como?? Eles mesmos são os autores do livro… Eles próprios falam de suas possibilidades, dificuldades e sobre as barreiras impostas pela sociedade… E mais… Nos ensinam maneiras de lidar com suas dificuldades e sobretudo nos dão um show de cidadania, nos mostrando o que eles (e a sociedade) precisam… Como diz Carol Golebski “A gente precisa de entendimento! Que as pessoa possam abrir a cabeça… As pessoas precisam abrir os olhos, os ouvidos e o coração… O corpo todo para enxergar a gente”
    E Bia Paiva com suas sábias palavras acrescenta: “… Existe sim vários tipos de deficiência que precisam ser aceitas na sociedade. Que há um desejo muito grande dessas pessoas com deficiência de pertencer ao mundo que elas vivem. Isso só vai conseguir se as pessoas lerem o nosso livro e entendem o quanto é importante nos dar acessibilidade, apoio, condições de apoio, para a gente mostrar para elas o quanto a gente pode melhorar, ser um cidadão completo, ser protagonistas de nossas própria vidas.” #superindico #carpediem

    • Responder

      Ana Lucia

      28 de março de 2017

      Fernanda, grata por ampliar nossa reflexão com seu comentário tão rico e com a indicação preciosa desse livro.
      É estimulante ver esses jovens ganhando voz e espaço na sociedade. Me sensibiliza ouvir o desejo de pertencimento deles, legítimo e natural do ser humano. Já estou procurando pelo livro aqui na net, quero lê-lo. bj carinhoso

  2. Responder

    Ana Lucia Machado

    31 de março de 2017

    Compartilhei este artigo com o Profº Dr. Ruy Cesar do Espírito Santo que me enviou o texto abaixo como contribuição dessa reflexão. Gratidão Profº Ruy.

    Educação e Poesia
    Educar
    Extrair do “mais dentro”…
    Acolher o aluno…
    Incluir cada um
    Pois nunca somos iguais…
    Desenvolver as “diferenças”…
    Permitir a alegria
    Para que surja a beleza
    Sempre com muito Amor…
    Assim deve seguir a Educação.
    Nunca prisioneira de um currículo…
    Deixar fluir o conhecimento em consonância com cada classe
    Que assim como os alunos será sempre “diferente”, única…
    Nunca “julgar” com avaliações
    Avaliar é punir o erro…
    O errante é aquele que anda…
    Cada aluno precisa Caminhar…
    Caminhar na direção de si mesmo…
    “Errar” até se “encontrar”…
    “O principio de toda a sabedoria”…
    Nunca alunos em “fila”…
    Os “sábios” da “frente” e os “ignorados” do fundo da sala…
    Sempre um círculo…
    Nem que seja necessário sentar no chão…
    Afastando-se as carteiras…
    Sempre permitir o “olho-no-olho”…
    O Educador precisa “ver” cada aluno…
    Profundamente…
    Saber de suas emoções
    Ouví-lo sempre olhando em seus olhos…
    Promover dinâmicas…
    Encontros entre os alunos
    Teatro…
    Deixar sempre fluir a energia presente…
    As “provas” devem ser o ponto de partida de “diálogos”…
    A grande pergunta é: “O que você aprendeu”?
    O que gostou mais? O que foi mais difícil? Qual a dúvida que fica?
    Responder a tudo isso equivale a dizer ao aluno: Eu te amo!
    Brincar!
    Permitir sempre que a “criança eterna” presente a nós todos possa divertir-se…
    Possa viver sua inocência, tantas vezes “escondida” pelas tecnologias presentes…
    Sentir a beleza de um sorriso
    A delicadeza de um “toque”…
    A imensidão de um verdadeiro abraço…
    Assim precisa Caminhar a Educação
    Despertando o indispensável “conhecimento de si mesmo”…
    Sabendo de sua singularidade
    De sua criatividade única
    Dando sentido a seu “fazer”…
    Afastar todo o medo do novo
    Resultante do “apego” ao “velho”…
    Perceber a beleza da permanente transformação
    Na eternidade do Agora
    Assim o Educador…
    Assim o Educando
    Até Sempre!
    Ruy

  3. Responder

    Roberta

    10 de maio de 2017

    Parabéns pelo excelente artigo! Meu filho é autista, mas são os pais de filhos com síndrome de down os precursores da luta pela inclusão. Devemos muito a eles! Emocionada com a poesia! Grata pela indicação de leitura! Forte abraço!

    • Responder

      Ana Lucia

      10 de maio de 2017

      Oi Roberta, grata pela participação. Realmente, os pais de filhos com Síndrome de Down abriram o caminho por onde já passaram muitos e ainda passarão. Temos muitas batalhas pela frente, mas acredito teremos em breve um grande salto, principalmente no âmbito escolar. abraço carinhoso

  4. Responder

    Thaís Renée Martins Silva

    10 de maio de 2017

    O artigo faz uma reflexão sensata sobre avanços e desafios a serem enfrentados. Sou mãe de Elisa que tem 4 anos e tem síndrome de Down. Quase sempre agradeço por ela ter vindo pra nós nesta realidade, onde os olhares sobre a Síndrome vem mudando. São olhares mais acolhedores e inclusivos do que no passado. E a informação, como temos acesso sem grandes dificuldades. E profissionais mais preparados para nós orientarem. Sou formada em Psicologia há quinze anos pouco vi sobre inclusão na Faculdade. Acredito que estamos no caminho certo, e cada dia mais venceremos os obstáculos.

    • Responder

      Ana Lucia

      10 de maio de 2017

      Olá Thais, muito bom seu comentário. Concordo com você e acredito que haverá num curto prazo de tempo um avanço muito grande, conquistas significativas, principalmente em relação a educação inclusiva. Tem muitas pessoas atuando e cobrando mudanças. Abraço carinhoso

  5. Responder

    DALCI LUIZ DE PAOLI

    11 de maio de 2017

    Ola. Ana Lucia.
    Agradeço o texto que compartilhou na minha postagem do Facebook.
    A cerca de 17 anos tive oportunidade de conhecer a escola Bem Me Quer , mantida pela APAE de Garibaldi-RS(serra Gaúcha). Nestes anos tive a oportunidade e a satisfação de contribuir e participar desta mudança de realidade e com as quebras de tabus, mudando os conceitos e forma de tratamento. Hoje os pais participam de desfiles cívicos e ou concertos natalinos, realizados nas ruas de nossa cidade, com seus filhos,com o maior orgulho.
    Nossa missão é faze-los felizes, participando na alfabetização, ou de grupos e teatros e danças mantidos
    pela escola.
    Todos nós somos felizes por isso.
    obrigado
    Abraço

    • Responder

      Ana Lucia

      11 de maio de 2017

      É uma alegria conhecer um pouco da sua trajetória, de sua participação neste importante trabalho de mudanças de paradigmas em nossa sociedade. Sinta-se à vontade para contribuir com sua experiência, pois ainda há muito trabalho a ser feito. Abraço carinhoso

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